Jorge de Lima, panfletário do Caos
Roberto Piva
Foi no dia 31 de dezembro de 1961 que te compreendi Jorge de Lima
enquanto eu caminhava pelas praças agitadas pela melancolia presente
na minha memória devorada pelo azul eu soube decifrar
os teus jogos noturnos indisfarçável entre as flores
uníssonos em tua cabeça de prata e plantas ampliadas
como teus olhos crescem na paisagem Jorge de Lima e como tua boca
palpita nos bulevares oxidados pela névoa
uma constelação de cinza esboroa-se na contemplação inconsútil
de tua túnica
e um milhão de vagalumes trazendo estranhas tatuagens no ventre
se despedaçam contra os ninhos da Eternidade
é neste momento de fermento e agonia que te invoco grande alucinado
querido e estranho professor do Caos sabendo que teu nome deve
estar como uma talismã nos lábios de todos os meninos.
O poeta Roberto Piva morreu em São Paulo, no dia 3 de junho de 2010
aos 72 anos. Ele estava internado no Incor (Instituto do Coraçao)
desde o dia 13 de maio. A causa da morte foi falência múltipla
de órgãos em decorrência de uma insuficiência renal.
Piva nasceu em São Paulo, aos 22 anos já era poeta reconhecido.
Foi descoberto pelo editor Massao Ohno e, aos 23 anos,
publicou sua obra-prima, Paranóia (1963).
O livro se esgotou em duas semanas e hoje é artigo de luxo
entre colecionadores. Depois disso, a obra Piazzas (1980),
confirmou seu talento. Quem perdeu aquela edição,
hoje pode encontrar esse e outros livros do poeta
em uma compilação da editora Globo de três volumes.
O último deles, Estranhos Sinais de Saturno, foi lançado em 2008.
O poeta tinha a alma inquieta.
Nadou incansavelmente contra a corrente e por isso é o principal nome -
junto com seu parceiro e amigo Cláudio Willer - da poesia marginal.
Para sobreviver, ele deu aulas de filosofia e produziu shows de rock.
Do Terra
6 de julho de 2010
Melhores poemas que eu li
Desmantelo azul
Carlos Pena Filho
Então pintei de azul os meus sapatos
por não poder de azul pintar as ruas
depois vesti meus gestos insensatos
e colori as minhas mãos e as tuas
Para extinguir de nós o azul ausente
e aprisionar o azul nas coisas gratas
Enfim, nós derramamos simplesmente
azul sobre os vestidos e as gravatas
E afogados em nós nem nos lembramos
que no excesso que havia em nosso espaço
pudesse haver de azul também cansaço
E perdidos no azul nos contemplamos
e vimos que entre nós nascia um sul
vertiginosamente azul: azul.
A encantação pelo riso
Velimir Khléblinikov
Ride, ridentes!
Derride, derridentes!
Risonhai aos risos, rimente risandai!
Derride sorrimente!
Risos sobrerrisos - risadas de sorrideiros risores!
Hílare esrir, risos de sobrerridores riseiros!
Sorrisonhos, risonhos,
Sorride, ridiculai, risando, risantes,
Hilariando, riando,
Ride, ridentes!
Derride, derridentes!
1910
(Tradução: Haroldo de Campos)
Subversiva
Ferreira Gullar
A poesia
Quando chega
Não respeita nada.
Nem pai nem mãe.
Quando ela chega
De qualquer de seus abismos
Desconhece o Estado e a Sociedade Civil
Infringe o Código de Águas
Relincha
Como puta
Nova
Em frente ao Palácio da Alvorada.
E só depois
Reconsidera: beija
Nos olhos os que ganham mal
Embala no colo
Os que têm sede de felicidade
E de justiça.
E promete incendiar o país.
Carlos Pena Filho
Então pintei de azul os meus sapatos
por não poder de azul pintar as ruas
depois vesti meus gestos insensatos
e colori as minhas mãos e as tuas
Para extinguir de nós o azul ausente
e aprisionar o azul nas coisas gratas
Enfim, nós derramamos simplesmente
azul sobre os vestidos e as gravatas
E afogados em nós nem nos lembramos
que no excesso que havia em nosso espaço
pudesse haver de azul também cansaço
E perdidos no azul nos contemplamos
e vimos que entre nós nascia um sul
vertiginosamente azul: azul.
A encantação pelo riso
Velimir Khléblinikov
Ride, ridentes!
Derride, derridentes!
Risonhai aos risos, rimente risandai!
Derride sorrimente!
Risos sobrerrisos - risadas de sorrideiros risores!
Hílare esrir, risos de sobrerridores riseiros!
Sorrisonhos, risonhos,
Sorride, ridiculai, risando, risantes,
Hilariando, riando,
Ride, ridentes!
Derride, derridentes!
1910
(Tradução: Haroldo de Campos)
Subversiva
Ferreira Gullar
A poesia
Quando chega
Não respeita nada.
Nem pai nem mãe.
Quando ela chega
De qualquer de seus abismos
Desconhece o Estado e a Sociedade Civil
Infringe o Código de Águas
Relincha
Como puta
Nova
Em frente ao Palácio da Alvorada.
E só depois
Reconsidera: beija
Nos olhos os que ganham mal
Embala no colo
Os que têm sede de felicidade
E de justiça.
E promete incendiar o país.
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