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5 de fevereiro de 2020



Flores de cana

Iremar Marinho

Flores de cana alastram 
o solo ácido de sangue 
dos mortos do latifúndio. 

O sol forte é testemunha 
dos canaviais-partidos 
(o doce terror dos campos). 

O Mundaú chora mágoas 
de gente amarga habitante 
do doce-mar sem limites. 

O sangue de demerara 
pulsa veia diabética 
de álcool e mel cabaú. 

Sabe da veia o açúcar, 
do sangue sabe o veneno. 
Sabe do clima este sol. 

Os afluentes jorrando, 
a cana se alastrando 
(o doce por ironia). 

A água morre de química, 
no Mundaú, vau de lágrimas 
dos ilhéus/vidas cortadas. 

Os cemitérios, às margens, 
dos mortos de chistosoma, 
de bala e colesterol. 

Por este rio escorre 
o desespero dos mortos 
partidos como os canais. 

Os afogados conspiram 
nas angras, dunas e mangues 
(os enforcados, às margens). 

O rio torto costura 
a mortalha desses náufragos 
das tibornas, das caldeiras. 

A lagoa, estuário 
de mortes (vidas negadas): 
cenário de funeral. 

A barra do mar-represa 
é tumba desses ilhéus 
do Vale da Flor de Cana.