Total de visualizações de página

Pesquisar este blog

26 de março de 2016

POEMAS DE LUIZ ALBERTO MACHADO



CARTA A MINHA CIDADE


Luiz Alberto Machado


ao meu rincão 
que soletrei sílabas de todos os tons 
deixo o meu desejo provinciano  
foi nas tuas praças que descobri a poesia  
foi na tua noite que desvendei mistérios  
foi no teu dia que morri muitas vezes 
foi no teu canavial  que deixei meu sangue  
foi no teu rio que comunguei com a vida  
dos bairros nobres ao baixo meretrício  
dos bueiros da usina aos estudos da faculdade 
da safra da cana à entressafra da razão 
da incompetência da câmara ao sucesso dos loucos 
dos desvarios comerciais aos crimes impunes  
das damas hipócritas às jovens sedutoras  
das reuniões inúteis às salas de dança 
dos cultores do passado aos artistas malucos  

me completei 
me dizimei 
e me consenti 
com certeza te deixo o meu velório  
e a paz de quem sorri.    



(Da antologia  POETAS DOS PALMARES,
organizada por Juareiz Correya,
em edição eletrônica, pela Panamérica Nordestal Editora, do Recife)




A LÁGRIMA DE NERUDA 



Meus conterrâneos, eis minha missiva: 
Estamos próximos do final do século 
Às portas de uma nova era 
Rogo, portanto, a paz 
Não difiro de nada 
Sou eu procedente do índio botocudo 
De negros escravizados e de brancos degredados de Portugal 

No peito um canto para Neftáli Reyes 
Contra os que se devoram no dia e na noite. 

No peito o meu canto com a nossa dessemelhança que é o tiro que dizimou Balmaceda fomentando nossas hostilidades.

Nosso suor ainda é vendido a preço vil 
A preço de cadáveres indígenas, negros e marginalizados. 

As mulheres, nossas irmãs, são as mesmas 
Nas favelas do Rio 
Nas callampas do Chile 
Nas jacabes do México 
Nos barrios de Caracas 
Nas barriadas de Lima 
Nas vilas miséria de Buenos Aires 
Nas catagrilles de Montevidéu 
E uma bola de cartola ainda determina o rival nos gramados de Santiago do Chile.

Meus conterrâneos, eis minhas palavras: 
A esperança ainda é o nosso amuleto na estética de Huidobro: a precisão de um armistício e de um sonho maior que o de Bolívar.


(Da antologia PRIMEIRA REUNIÃO,
Edições Bagaço - 1992)

____________________________________________________________
LUIZ ALBERTO MACHADO é palmarense, filho do poeta Rubem de Lima
Machado. Poemas publicados em jornais locais e de diversos Estados
brasileiros. Ainda muito jovem, participou dos movimentos culturais de
Palmares. 

Músico e escritor, é também autor de diversas peças e dirigiu 
grupos teatrais amadores. Participou de vários festivais de música. 
Publicou, entre outros,  os livros de poesia Para viver o personagem
do homem (1982), A intromissão do verbo (1983), Raízes e Frutos
em parceria com Rubem de Lima Machado (1985), Canção da Terra
(1987), Paixão Legendária (1991) e Primeira Reunião (1992). 
 
Publicou vários títulos de literatura infantil.  Atualmente vive em Maceió (AL),
onde dirige a Edições Nascente e edita sites literários e várias páginas virtuais.


24 de março de 2016